sábado, 16 de março de 2024

Diário do absurdo e aleatório 93 - Emanuel Lomelino

Não sou saudosista porque tudo tem o seu tempo e quem fica agarrado ao passado perde tempo presente que poderia estar a dedicar à construção do tempo futuro. Contudo, porque nestas coisas da memória há sempre uma saudade, sinto falta das conversas, sobre escrita, que tive em algumas tertúlias, com gente que sabia da temática e como partilhar conhecimento.

Sinto essa ponta de nostalgia porque as verdadeiras tertúlias, as genuínas, mesmo sendo escassas, eram momentos de reflexão compartilhada que enriqueciam cada um dos envolvidos. Debatiam-se ideias, conceitos e formas de trabalhar as palavras, num ambiente que, não sendo de erudição absoluta, permitia pensar com mais critério o ofício das letras.

A saudade fica por aqui porque tudo o resto, em redor destas tertúlias, era movido pela paixão do exibicionismo inútil e bacoco, um género de vaidade pessoal, que muitos sentiam necessidade de exibir com a urgência de quem precisa de alimento para a boca. Para não falar da burrice de alguns sobre o que é uma tertúlia. Mas não vamos por aí senão este texto transforma-se numa vulgar ode de escárnio e maldizer.

A verdade é que sinto tantas saudades dessas poucas discussões inteligentes que, perante a reduzida franja de autores interessados em partilhar opiniões e crescer, sou obrigado a conversar com os de outrora – apreciadores de tertúlias – como quem tem amigos imaginários.

Assim, varro a minha biblioteca, de ponta a ponta, e mantenho diálogos com os clássicos da literatura e tento absorver o que me dizem na esperança de que essa aprendizagem me seja benéfica, como úteis foram as conversas com Alexandre Carvalho, Celso Cordeiro, José Félix, António Boavida Pinheiro, António MR Martins, Xavier Zarco, Alvaro Giesta, João Carlos Esteves, Francisco Valverde Arsénio, Paulo Afonso Ramos, Joaquim Evónio e, especialmente, Vítor Cintra, com quem aprendi a descobrir a minha voz literária.

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