quinta-feira, 30 de maio de 2024

Diário do absurdo e aleatório 324 - Emanuel Lomelino

Interrogo-me sobre o paradeiro das palavras que, por falta de caneta e papel, ficaram por escrever. Aquelas que, abandonadas a sorte nenhuma, ficaram recolhidas no orfanato do léxico à espera de serem adoptadas por outros progenitores mais merecedores e sedentos da sua significação e importância.

Quantos serão os adjectivos, vagabundos silenciados com uma folha curricular debaixo do braço, que deambulam de estômago vazio e a esperança cosida na lapela?

Por onde andarão os advérbios sem modos e de nariz empinado que emergiram num momento de lucidez jamais registada?

Para onde navegarão agora aqueles verbos imponentes, contudo esquivos, que miraram o porto da criação com olho gordo, mas não saíram da embarcação da mente?

Como estarão os substantivos que um dia afloraram e foram barrados nos portões do estro, por não haver trajes de tinta nem hábitos de papel para os embrulhar numa qualquer história sem moral?

Como pode ser esdrúxula uma tarde sem pena nem caderno e palavras reprimidas!

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