sábado, 4 de janeiro de 2025

Papaguear cultura 7 - Emanuel Lomelino

Papaguear cultura 


7


Na democracia de um mundo perfeito todos têm direitos e deveres, em igual medida.

Na democracia de um mundo perfeito todos têm direito a expressar as suas opiniões, independentemente das razões que os assistem, e todos têm o dever de respeitar todas as opiniões alheias, principalmente as que divergem das suas.

Na democracia de um mundo perfeito a lei permite a manifestação pública de todas as opiniões, desde que feitas ordeiramente, e impede as reacções contrárias ao direito de opinar e manifestar.

Mas o mundo perfeito só existiria se a humanidade também o fosse, e como a democracia é usufruída por humanos, para muitos ela é o seu direito de manifestar opiniões e tudo o resto é antidemocrático, inclusive as opiniões dos outros e as leis que impedem alguém de impor a sua opinião sobre as demais. A democracia perfeita é uma utopia porque será sempre aquilo que cada um entender, até que os outros se calem e submetam.

Resumindo: muitos aproveitam o espírito da democracia para dizerem e fazerem o que lhes aprouver sem darem conta de estarem a agir como verdadeiros ditadores.

E tudo isto faz-me acreditar, cada vez mais, que apenas as artes são verdadeiramente democráticas e são o único elo da humanidade com a perfeição.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Pensamentos literários 11 - Emanuel Lomelino

Pensamentos literários 


11


Os livros! Esses seres mascarados de inânimes que, quando são abertos, agrafam a nudez das suas letras aos nossos olhos, fazendo-nos perder a noção de tempo e espaço enquanto nos transportam nas asas do deslumbre.

Os livros! Esses malvados seres que enfeitiçam a mente, guiando-nos pelos labirintos da reflexão, semeando ideias, instigando pensamentos.

Os livros! Esses pérfidos apóstolos da sabedoria que lavram, nos âmagos menos ociosos, a terra da razão, como quem, com toda a naturalidade e experiência, coloca roupa a secar ao sol.

Os livros! Esses censores da ignorância; esses opositores do analfabetismo; esses legisladores de literacia; que não receiam infetar-nos com o vírus do conhecimento.

Os livros! Esses camuflados seres opiáceos que nos fazem vagabundear, de página em página, como toxicómanos literários.

Ah, os livros! Metadona do meu vício.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Papaguear cultura 6 - Emanuel Lomelino

Papaguear cultura 


6


No universo de escrita que construo letra a letra, leitura a leitura, através dos constantes aprendizados e exercícios que me proponho, tudo tem uma razão de existir.

A partir do momento em que ganhei consciência de autor, e consegui descobrir a minha voz literária, tudo passou a fazer sentido e as peças do puzzle, finalmente, começaram a encaixar-se.

Não prescindo de desafiar o meu estro, nem abdico de aprofundar o meu conhecimento sobre muitos temas, porque acredito que o aperfeiçoamento só acontece com estudo e prática continuada – e mesmo isso não é garantia alguma.

E alicerço estas convicções em algumas frases-chave ditas/escritas por gente que sabia, bem mais do que eu, da arte-escriba.

Para não voltar a escrever um texto com pinceladas de concretismo, limito-me a parafrasear o Barão de Montesquieu (filósofo e escritor francês): “É preciso estudar muito para saber um pouco”.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Epístolas sem retorno 23 - Emanuel Lomelino

Oscar Wilde
Imagem pinterest

Prezado Oscar,


Nem só as palavras são alvo de más interpretações. O silêncio também o é. E o maior erro que alguém pode cometer, ajuizando o silêncio, é associá-lo à solidão - mesmo havendo quem, com ambos, assim se relacione. Por mais paradoxo que soe, as palavras têm uma ligação mais estreita com a solidão do que o silêncio.

Ao invés das palavras, que moldam pensamentos mas estão sempre prenhes de entorno, isto é, podem ser influenciadas pelas opiniões exteriores, tudo o que advém do silêncio é puro, imaculado, genuíno e sem arestas polidas.

O mundo do silêncio, ao contrário do entendimento generalizado, é o Santo Graal da autorreflexão e do crescimento individual. É no silêncio que nos descobrimos na plenitude do que somos, para o bem e para o mal. É no silêncio que encontramos as verdades mais incómodas e esbarramos na essência dos nossos temores mais pungentes.

Sim, se todos soubessem o quanto as suas palavras são mal interpretadas, haveria muito mais silêncio, no entanto, seria bem mais complicado identificar os que sofrem de solidão crónica.


Reflexivo

Emanuel Lomelino